segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Portuñol e Portunhol


Eu falo em português com o Paco. Algumas palavras e expressões são do espanhol, como os dias da semana. Desisti de falar 2af, 3af, 4af, etc.. Paco acha que 2af é “martes”, dá a maior confusão. Como bem disse uma amiga, citando Neruda:

“Prestes me invito a almozar para um dia de la semana seguiente. Entonces me sucedió una de esas catástrofes sólo atribuible al destino o a mi irresponsabilidad. Sucede que el idioma portugués, no obstante tener su sábado y domingo, no señala los demás días de la semana como lunes, martes miércoles, etc, sino como endiabladas denominaciones segunda-feira, terça-feira, quarta-feira, saltando-se la primera para complemento .Yo me enredo enteramente en esas feiras, sin saber de que día se trata. (…) La quarta-feira me enteré de que Prestes me esperó la terça-feira inútilmente con la mesa puesta mientras que yo pasaba las horas en la playa de Ipanema. (…) Cada vez que me acuerdo de esta historia, me quisiera morir de vergüenza. Todo lo he podido aprender en mi vida, menos los nombres de los días de la semana en portugués.” Pablo Neruda- Confieso que he vivido


Eu imaginava que, aos poucos e com os anos, o espanhol predominasse e que o português ficaria em segundo plano. Porém acho que não será dessa forma.

Assim que comecei minha aventura deste lado do Atlântico, sabia que falaria portuñol, com sotaque do interior de São Paulo. Tive muita dificuldade em começar a usar o pronome de tratamento pessoal “Tú”. Para mim, "tú" sempre foi coisa de menino de rio, de carioca e santista. Como paulista sempre falei “cê”. Quando me forcei a falar "tu", parecia que outra pessoa falando, achava falso. Ter que renunciar ao “você”, “ocê”, “cê” falado foi duro, foi como deixar minha identidade de caipira um pouco de lado.



O que eu não podia sonhar é com o Paco introduzindo palavras de português no nosso vocabulário caseiro. Comigo, ele fala portuñol e, assim, temos uma língua própria. Fofo! Legal é ver a cara das pessoas no metro, ver as senhoras sem entender o que aquele espanholito fala com a gringa. 

Ele aprendeu português super rápido no Brasil. No final da nossa viagem de férias ele estava com um português bem bacana, com conjugações verbais aproximadas: “Eu he falado para você”. “Te falei, Paco!”. “Eu fize o almoço”. “No es yo hice comida. É eu fiz”. Eu fiquei super orgulhosa, achando lindo! 

Do verão, há duas conversas engraçadíssimas:

Ainda no carro indo para praia, eu estava de nhén-nhén, pentelhando o Paco e ele me responde em bom português: “Nem fudendo!”, com sotaque em espanhol. Eu exclamei: “putz ... não sabia que eu falava tanto isso!” É, falo, sempre que eu não quero fazer alguma coisa de forma nenhuma. Meu jeito de dizer que “não, não e não” e foi  como Paco reproduziu. Vai dizer, sou uma ótima profa?!

Dias depois, apareceu uma espinha enorme no meu rosto, tipo Everest no dia que entrar em erupção antes do apocalipse. Paco olhou bem e sorriu: “Que gosma!”, sem mais. Eu sabia que eu falava “meleca” mas “gosma” eu não lembrava não!

O Paco gosta também de reproduzir todos os “inhos” e “inhas” que eu falo. Bonitinho, né? Mas ele sempre esquece o que é soneca e cafuné.